O Brasil tem uma oportunidade histórica de criar um sistema de previdência inclusivo para trabalhadores informais e de baixa renda, aprendendo com experiências internacionais de países que enfrentaram cenários macroeconômicos e sociais semelhantes. É o que mostrou a plenária “Previdência 5.0: Soluções Previdenciárias Inclusivas” realizada no segundo dia do 46º Congresso Brasileiro de Previdência Privada (CBPP).
Ao apresentar o salto que os modelos previdenciários da Índia e do Reino Unido deram, especialistas deixaram claro que essa transformação, além de possível, é urgente, e o caminho para ela ser implementada no Brasil já está pavimentado. “O Brasil está começando a partir de um estado de maturidade, e não do zero”, disse Gautam Bhardwaj, Cofundador do PinBox Solutions Singapore.
Segundo Bhardwaj, globalmente os sistemas previdenciários enfrentam o mesmo dilema: inclusão limitada, informalidade elevada e desequilíbrio fiscal. “Muitas das lições que aprendemos na Índia foram ‘na marra’”, afirmou, ressaltando que o Brasil pode evitar erros já cometidos por outros países.
O economista Raul Velloso reforçou a urgência da questão ao apresentar dados sobre o envelhecimento populacional brasileiro, com a razão de dependência de idosos superando os Estados Unidos e se aproximando de níveis europeus, e o crescimento explosivo dos gastos previdenciários, que nos municípios chegou a uma taxa média de 12,5% ao ano entre 2011 e 2018. “Precisamos encontrar um caminho para atacar e resolver esse problema”, alertou, destacando que a expansão contínua desses gastos está asfixiando o investimento público e restringindo o potencial de crescimento do país.
Essa “bola de neve” evidencia uma expansão de regimes próprios de previdência municipais sem equilíbrio atuarial e a falta de reformas previdenciárias locais, reduzindo a capacidade de investimento e, por consequência, o crescimento da produtividade e da renda.
Esse cenário de crise previdenciária não é exclusivo do Brasil. Tanto a Índia quanto o Reino Unido enfrentaram situações semelhantes: envelhecimento acelerado da população, sistemas excludentes que deixavam milhões de trabalhadores desprotegidos e custos fiscais insustentáveis. E ambos os países implementaram reformas estruturais que reverteram o quadro, oferecendo lições valiosas.
Reforma previdenciária indiana – Em 2005, dos 500 milhões de trabalhadores indianos, apenas cerca de 80 milhões tinham acesso a benefícios previdenciários, enquanto mais de 300 milhões de jovens tinham capacidade de poupar. O país enfrentava uma projeção de 350 milhões de idosos até 2050 e um custo previdenciário que poderia chegar a US$ 220 milhões anuais caso nada fosse feito.
Gautam Bhardwaj explicou que a solução veio através da criação de um sistema de baixo custo, com supervisão pela Pension Fund Regulatory and Development Authority (PFRDA) e um Trust central, que a Índia conseguiu lançar um novo mercado de previdência digital com custo próximo de zero. No modelo, cada pessoa recebe uma conta previdenciária única e portátil que acompanha o trabalhador independentemente de mudanças de emprego ou localização.
Como resultado, em 20 anos o país saltou para 89,5 milhões de participantes aderentes à previdência e US$ 178,2 bilhões em ativos sob gestão. Um destaque especial é o programa APY (Atal Pension Yojana), uma micro pensão de benefício definido criada em 2015 que foi desenhada especificamente para trabalhadores de baixa renda, alcançando sozinha 69 milhões de pessoas.
Inspirada neste modelo bem-sucedido, a Abrapp vem articulando a implementação de sistema semelhante no Brasil por meio de diálogos no Congresso Nacional, buscando criar um modelo que permita a inclusão previdenciária massificada de trabalhadores informais e de baixa renda utilizando a estrutura já consolidada das Entidades Fechadas de Previdência Complementar (EFPC).
“No Brasil, a oportunidade é enorme e a solução é bastante objetiva e direta”, avaliou Bhardwaj, destacando que o país já possui infraestrutura digital robusta, diferentemente da Índia em 2005. Contudo, as lacunas brasileiras são igualmente desafiadoras: aproximadamente 40 milhões de trabalhadores não são elegíveis para benefícios de previdência nem poupam para aposentadoria, e 26 milhões de idosos não terão benefícios previdenciários se o cenário atual persistir.
Por outro lado, se um trabalhador de 30 anos poupar US$ 25 por mês, pode ter um benefício mensal de US$ 800 aos 60 anos. “Se o Brasil introduzir uma poupança previdenciária para apenas um quarto dos trabalhadores excluídos, conseguiria gerar US$ 100 bilhões em nova poupança de longo prazo em uma década”, projetou Bhardwaj.
O caso britânico – O Reino Unido enfrentou uma crise semelhante em 2002, quando havia provisão previdenciária inadequada e em declínio, população envelhecendo rapidamente, taxa de natalidade em queda e praticamente nenhuma previdência privada. A solução foi implementar a inscrição automática em 2012. No Brasil, instrumento semelhante foi aprovado em 2024, pela Resolução CNPC nº 60.
Helen Dean, ex-CEO do NEST (National Employment Savings Trust) e atual Presidente do Conselho do fundo The Standard Life Master Trust, relatou que “foi um grande experimento nacional”, e o impacto era desconhecido, mas os resultados superaram todas as expectativas: 20 milhões de trabalhadores foram incluídos até 2021, com uma taxa de desistência de 8% a 14%. Hoje, 79% da população britânica considera a adesão automática positiva, e 2 milhões de empregadores oferecem o benefício.
“Como a maioria das pessoas não toma ação, a inscrição automática garante que a maioria poupe, ao invés de a maioria não poupar”, explicou Dean. Porém, ela alertou que o modelo britânico, com mais de 20 anos, enfrenta hoje desafios que o Brasil pode antecipar: lacunas na cobertura, níveis inadequados de poupança, aversão ao risco que resulta em baixos retornos, e dificuldade de aderência dos trabalhadores de plataformas digitais e população de baixa renda.
Dean destacou que o Reino Unido está evoluindo seu modelo de 20 anos para resolver os problemas identificados. No mercado brasileiro, isso significa que ao criar um sistema novo, essas lacunas já devem estar preenchidas. “O Brasil já fez muita coisa, e se reunirmos nossas experiências veremos que temos presentes os elementos para um sistema previdenciário que inclua a todos. Cada trabalhador tem o direito de construir uma aposentadoria digna, segura e adequada”, completou.
As vantagens brasileiras – Conforme foi apresentado pelos especialistas, o Brasil parte de uma posição privilegiada para implementar uma reforma de inclusão previdenciária. Bhardwaj destacou que o país já possui infraestrutura digital robusta que a Índia precisou construir do zero: o Cadastro de Identificação Nacional (CIN), o Pix como sistema massificado de pagamentos digitais móveis, a alta penetração de smartphones, e a elevada alfabetização digital com uso generalizado de redes sociais.
No âmbito previdenciário, o Brasil conta com entidades comprometidas e bem reguladas, representadas pela Abrapp, que vem avançando em um alinhamento entre os objetivos do setor e as políticas públicas e regulatórias.
Diante desse cenário favorável, os especialistas traçaram um roteiro claro para o Brasil. Bhardwaj destacou princípios essenciais da experiência indiana, entre eles garantir alinhamento de incentivos entre todos os stakeholders, permitir flexibilidade nas contribuições conforme renda irregular, priorizar simplicidade digital, projetar para mobilidade entre empregos e localizações, e testar pilotos antes de escalar.
Dean complementou recomendando aproveitar a inscrição automática para usar a inércia comportamental a favor da previdência complementar, e evitar desde o início a fragmentação de contas que o Reino Unido enfrenta hoje. Os especialistas foram unânimes: o Brasil possui todos os elementos necessários para tornar a previdência complementar totalmente inclusiva.
O 46º CBPP é uma realização da Abrapp, UniAbrapp, Sindapp, ICSS e Conecta. Patrocínio Diamante: ASA, Evertec, Itajubá Investimentos. Patrocínio Ouro: Aditus Consultoria Financeira, Aon Consultoria, BB Asset, BNP Paribas Asset Management, Bradesco Asset, Galapagos Capital, Itaú, MAG Seguros, Mirae Asset, Principal Asset Management, REV Corretora, Safra, Santander Asset Management, SulAmérica Investimentos, XP Investimentos. Patrocínio Prata: Caixa Asset, Inter, MarketAxess, PFM Consultoria e Sistemas, Porto Asset, Trígono Capital, Vinci Compass. Patrocínio Bronze: Anbima, Az Quest, Consepro AI, Constância Investimentos, Fin4She, FRAM Capital, HMC Capital, Icatu Vanguarda, IIA Brasil, Investira, MAF Consultoria e Treinamento, MAPFRE Investimentos, Mirador Atuarial, Multifonds, Opportunity, Patrimonial Gestão de Recursos, Polo Capital, PORTO REAL, PRI, PRP Soluções, Real Investor, RJI Investimentos, TAG Investimentos, Tivio Capital, Vila Velha Corretora de Seguros, WEDAN Consultoria. Parceiro de Mídia: Gazeta Mercantil. Apoio Promocional: ABIPEM, Abrasca, ABRH, ABVCAP, ANABB, ANCEP, ANFIP Nacional, APIMEC Brasil, ASCPrev, B3, CRA-SP, FACPCS, FEBRABAN, FIAP, FIPECAFI, IBA, IBGE, Ibracon, PLANEJAR, Previpar, Tchê Previdência, UNIDAS.



